sábado, 17 de dezembro de 2011

PRESENTE AOS LEITORES


Faz muito tempo que digitalizamos esta obra do João Gumes, Patrono da Cadeira 2 na Academia Caetiteense de Letras - e em domínio público.

"Os Analphabetos" foi publicado em 1928, já perto de sua morte (1930), em um volume; na época em que fizemos este trabalho ocupávamos a gerência de cultura da cidade - e a velocidade da internet e capacidade dos computadores me forçaram a criar 2 arquivos... Algo que hoje soa até meio estranho!

Embora tenhamos conservado o "ph" no título, o português foi atualizado; não é aquilo que chamamos de "leitura fácil", pois que fora algo escrito para ser publicado "aos pedaços", nas edições do jornal A Penna.

Seguem os links:


PARTE 1


PARTE 2

Boa leitura, então.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Caetité se enche de livros



No mês de julho de 2011 encerramos um semestre sui generis em nossa história; nada menos que quatro livros nos chegaram, falando da terra ou de sua gente, de memórias e biografias...

Inicialmente tivemos o livro autobiográfico do professor Waldir Silvão, filho do também professor Alfredo, nome que transformou a história caetiteense, ele que dirigiu a Escola Normal e foi nosso prefeito nos idos de 1946... A obra, um belo volume, mostra o cuidado que Silvão teve ao longo da vida em manter sua trajetória no magistério devidamente registrada e não só: relata as amizades e manifestações de apreço, como as poesias da caetiteense Aída Ladeia, e de alunos e colegas que semeou ao longo de sua carreira em diversas cidades da Bahia.

Na Sessão Ordinária da Academia Caetiteense do mês de maio de 2011 a obra foi então apresentada e um fato curioso se deu: estavam ali dois de seus ex-alunos: a professora Sônia Silveira, que com ele estudou em Caetité, no Instituto de Educação Anísio Teixeira e Benedicto Antônio dos Santos, seu ex-aluno em Santo Amaro da Purificação... Ambos confirmavam, nos relatos, a severidade e seriedade do antigo mestre, cuja saudade era então amenizada pelo imorredouro registro em um livro...

Dia 14 de julho foi a nossa vez de trazer o livro Anísio para Caetité. Deste já tivemos ocasião de falar disto, pois era mesmo nosso papel não deixar diminuir, na terra natal, o conhecimento sobre o grande educador; ali registramos suas passagens biográficas em Caetité, e tudo aquilo que fez pela cidade. Anísio não precisava, de fato, que alguém tão ínfimo dele cuidasse – mas muitos têm agora uma obra básica a nortear futuras pesquisas e aprofundamentos. Porque nenhum lugar melhor para se retratar o imortal educador, senão num livro...

Finalmente, em 23 de julho, dois novos volumes foram aqui lançados: a biografia política do caetiteense Paulo Jackson, e o registro dos “causos” engraçados da cidade, sob a batuta do Etinho...

No primeiro livro, lançado na Casa Anísio Teixeira, o leitor terá conhecimento do trabalho e carreira política de Paulo Jackson, na pena da Joandina Carvalho. Paulo, com quem tivemos ocasião de partilhar várias lutas, foi mesmo uma figura ímpar – e cuja morte prematura fez com que nossa história citadina se diminuísse de forma bastante drástica... Um escrito sobre ele é, portanto, só um pequeno passo para ilustrar o quanto viveu, pois foi de fato uma vida que merece a imortalidade que dão os livros...

O segundo livro lançado naquela memorável noite – Pérolas do Humor Caetiteense – do Etevaldo Nônico, reuniu uma Caetité que somente aqueles que a vivem de fato conhecem e, por que não, reconhecem: a dos “causos”; nossas mais significativas figuras saem do anonimato e ganham a perenidade, agora jamais serão esquecidas e, por isso, é motivo de orgulho termos podido colaborar minimamente com o Etinho...

Ali, o Américo Oliveira, que foi peça chave na concretização da obra, frisou o imenso orgulho de ser natural de uma cidade que, como poucas, assistia a tanta produção literária – e resumiu o sentimento de todos. Falamos em nome da Academia, então, frisando que já estava na hora de Etinho vir a compor nossos quadros acadêmicos... É uma ideia, apenas, mas também uma esperança de que este tenha sido o primeiro de outros tantos volumes que, com certeza, nossa cidade permite sejam produzidos, com sua cultura tão rica e, agora, parte dela gravada para sempre nas páginas de mais um livro...

Estes foram os quatro livros que surgiram, em menos de meio ano. E já se promete para setembro mais um, desta feita pelo Giovanni Silveira. Pois é... Caetité realmente assiste a um momento ímpar! Perdemos o medo dos livros? Esperamos que sim... Ainda estamos longe dos tempos em que a cidade respirava cultura, ainda vemos jovens sem nada na cabeça a iludir-se com músicas nas alturas, exibindo suas baixezas... Ainda temos muito a trilhar para que isto de fato venha a ser realidade cotidiana, em que o caetiteense sem leitura se envergonhe de sê-lo! Mas, numa coisa todos podemos nos orgulhar: temos aquilo que faz um povo como o nosso ser, de fato, diferente, único: temos livros!

Caetité, julho de 2011.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

O Advogado e os Livros

“Que nenhum tirano
Pregue o povo na cruz!
E que nenhum insano
Ao crime faça jus!”

José Almiro Gomes (in: “Natal de Jesus”, Coaraci, Natal de 1982)

Meu tio José se foi, no dia 8 de junho de 2011. “José, meu irmão mais velho” – como sempre falava minha mãezinha, quando a ele se referia. E quando ela morreu, em 2005, foi a última vez que nos falamos.

No ano de 1984 passei com ele alguns dos momentos mais agradáveis de minha vida – ao lado daqueles que hoje me são os companheiros: os livros.

Poucos falavam tanto, e raros tinham tanto ainda por falar! Graças a ele publiquei minha primeira poesia, e ouvi muitos poemas; conheci Neruda, fui apresentado a Lorca, descobri os plágios de Jorge Amado, e me admirava em ver a intensa religiosidade daquele homem que, preso na juventude por ser comunista, convertera-se ardorosamente a uma fé que contagiava.

Tio José, contudo, só teve uma rápida presença em meus tempos de faculdade – encontrei-o num Congresso de Direito, dos muitos que fui naquele tempo, na banca de um livreiro a comprar livros.

Livros! Quantos livros!

***

Anos depois, já formado, encontrei certa feita o Confrade Romilton Sobrinho, que me antecedeu na Presidência da Academia, junto a um vendedor de obras jurídicas, daqueles vagamundos. Em Caetité nenhuma biblioteca se iguala à dele, e a mim cabia ser expectador daquela negociação. O vendedor elogiava o acervo do colega, mas em dado momento comenta que, apesar de Romilton ser uma traça, havia na Bahia um advogado que nenhum desembargador possuía cabedal maior. E foi falando, falando, até que eu consegui soltar um “Eu sei, é muito livro mesmo”. Os dois pararam, me olhando, surpresos – eu que até então estivera meio alheio diante daquela troca de informações entre ambos... O livreiro me desafiou: não poderia conhecer, pois tal advogado morava numa pequena cidade, a centenas de quilômetros de Caetité! Então perguntei-lhe: “Ele não mora numa casa com um andar que é todo a biblioteca?” – foi o bastante para o homem arregalar os olhos, admirado, pois eu acertara. Como sabia aquilo? “Ele é meu tio”, expliquei...

***


Tio José fora bem novo para Coaraci, então uma jovem cidade que se erguia sobre o ouro que foi a exploração do cacau no Sul da Bahia. Apesar de lugar violento, “terra de jagunços” diriam, construiu uma sólida carreira advocatícia, foi maçom, enfrentou as agruras desta profissão ingrata dos embates jurídicos... Foi ameaçado de morte por um juiz venal que ele, cioso do Direito, confrontara os desmandos e afastara...
Apesar de ser o “irmão mais velho” da minha mãe, o tio José tinha sua filha mais velha, Rosemarie, com a minha idade – sendo eu o caçula da Marion. Seguia-se a Marta Simone, afilhada de meus pais. Vinha então o outrora franzino Franklin José, que seguiu com brilhantismo a carreira paterna; Lílian Maria (com quem aprendi a chamar “paciência” de “titienca”) era a caçula até a chegada da quarta menina, que recebeu o nome da mãe – Edileusa.

O vasto mundo que viveu o tio José foi também um mundo de transformações profundas – uma geração que assistira a dolorosa e prematura morte da mãe porque inda não havia entre nós a penicilina – e mergulhou afinal pelo século XXI das aventuras tecnológicas, é algo que apenas os pósteros poderão um dia palidamente compreender, com aquele olhar da distância.

Não é o olhar que agora tenho... É sim o olhar de tristeza e dor da proximidade, algo que mesmo a distância imposta pela vida é incapaz de calar – porque é a dor do sangue, do parente que se vai.


O homem dos livros, dos sonetos que guardo até hoje – apesar de já ter destruído os meus próprios versos canhestros – revive na imagem da fotografia que volta e meia reencontro e que ele me pediu para tirar, eu com aquela máquina infantil, a registrar algo que ainda amo em Caetité – um carro de bois.

Um carro de bois é anacrônico, marca de um tempo passado que resiste emitindo seu lânguido rangido. Meu tio José, o “irmão mais velho”, foi ele também anacrônico: um homem que amava os livros, num país que não os lê...

Que Deus o receba, como no dia que me chamará também, talvez como um dia brincava comigo meu tio José Almiro: “André Luiz, André Ruiz, André Juiz”... Para que eu finalmente entenda, meu tio, que “juiz” serei de mim mesmo.

Porque agora, com vossa perda, meu único juízo é o de que a Advocacia baiana, com “A” maiúsculo, perdeu um de seus maiores nomes.
Caetité, 9 de junho de 2011

terça-feira, 17 de maio de 2011

Adeus a Omar

Mais um vazio em Caetité
15 de maio de 2011, dia em que tiramos a foto mais abaixo, perdemos o amigo e colega Omar Montenegro Cerqueira de Oliveira.


Quando eu estava no pré-primário, na Escola de Aplicação Anexa ao Instituto Anísio Teixeira, minha sala ficava ao fim do corredor. Do outro lado ficava a sala do segundo ano primário, era onde Omar estudava. Acho que esta é a minha mais antiga lembrança desse amigo que, desde aquela época, já era um pequeno “playboy”, ou “bad boy” – à falta de termos melhores em nosso idioma para definir aquilo que o menino já mostrava ser...


Consegui uma fotografia daquela época, onde ele aparece, criança, com aquele cabelão “jovem guarda” dos anos 1970; foi um achado, e não pude deixar de lhe falar, quando o encontrei pouco tempo depois - e combinarmos em breve repassar-lhe a cópia... Mas isto nunca aconteceu, ela veio parar aqui nesta despedida...

Cresci numa Caetité em que Omar era sinônimo de boa vida, onde encontrá-lo era o mesmo que ver belas companhias; mesmo quando ambos moramos em Salvador, começo da adolescência, encontrávamos no apartamento do Rívoli onde Opalah reunia a “galera de Caetité”: ele sempre aparecia, acompanhado do então amigo inseparável Paulo César...

São muitos os casos, as lembranças; nunca brigamos – o que deve ser digno de nota! Éramos todos briguentos, na juventude! Fazia parte... Mas eu e ele nunca! E mesmo para aqueles com quem brigava, logo estava arrependido, tentando se desculpar (bem diferente de mim). Na minha juventude, quando eu achava que estava isolado, ou até que ele nem se lembrava de mim, privamos de vários momentos de bom bate-papo – algo não muito comum, numa época em que um ou dois anos de diferença na idade eram quase um abismo a separar as turmas.

Lembro-me que uma vez Omar abriu um boteco, que logo fechou; fechou bem rápido! Um dia perguntei onde ficava e ele contou-me que já não existia mais, queixando-se dos “maus pagadores”... Eu sorri e comentei: o problema é que vendia fiado aos amigos – e os amigos eram muitos!

Omar formou-se em Direito no ano de 2001, em Poços de Caldas, e voltou a Caetité. Não sei se era sua “praia”, é uma praia árdua, ingrata, as lides jurídicas... Um dia ele me propôs abrirmos um escritório juntos. Queixava-se de ficar sozinho na casa, e falou-me de suas andanças solitárias de moto, da vez em que pedira a Deus um sinal – e este lhe respondera...

Senti-lhe esse vazio que o tempo cria. Tentei enxergar aquele cara que todos invejávamos, anos atrás. Mas já tudo estava diferente de todo o antes. Lá pelas tantas eu lhe pedi para não contar aquelas coisas pra qualquer um, pois a maioria das pessoas não as compreendia...

O lado místico, verdadeiro, da vida, nos chama sempre. Para Omar, a perda da mãe amada foi este chamado – talvez como o foi para mim a perda da minha mãezinha. Aquelas horas que passamos, conversando, me soaram um tanto confusas –as coisas andam assim... Por fim, brinquei, como o pai dele fizera comigo, outro dia: vão dizer que aderimos politicamente, se o virem aqui em casa! Ele riu, e respondeu sério: “Que se dane o que vão dizer!”


Gostava de contar os filmes que vira. Uma vez, no fórum, narrou-me quase toda uma comédia – que depois assisti, lembrando de como aquelas cenas divertiram-no...

Hoje, dia em que deveríamos começar uma semana, meu peito está esfacelado... Uma dor de quem pensa que poderia ter feito mais pelo amigo, estado mais perto, ter rido mais da brincadeira que ainda ontem ele me fizera, dizendo que eu lhe tirara das mãos um cravo que fora lançado por um jovem noivo...

Mas sei que não tirei-lhe o cravo da mão, ontem. Ele apenas nos divertia, como sempre o fez. Omar sempre nos divertiu, sempre... Mas não agora! Sua perda longe está de ser algo assim – e a imagem que fica é de que nossa cidade, que cresce como nunca, acaba mais uma vez ficando menor!
Caetité, 16 de maio de 2011

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Ao jovem médico



(cartinha que mandei ao dr. Leone Koehne Ribeiro, por ocasião de sua formatura...)

Olhando para si mesmo, qualquer um pode imaginar o quão difícil e complexo é este mecanismo que todos os dias acorda e diz: estou vivo!

Que se levanta, move-se, pensa, age, reage, interage...

Milhões de anos fizeram cada corpo, evoluindo desde a molécula que se agregou uma à outra, e mais outra, formando então uma primeira célula, carregando em seu núcleo a carga comum do DNA, que lutaria assexuada ou sexuadamente para perpetuar-se, unindo-se a outras tantas, formando seres cada vez mais e mais complexos...

E estes seres, todos, trazem em si as ligações para a saúde, a doença, a vida e a morte...

Mas o corpo nem sempre é a tônica...

Algo, de fato, não se encontra – desde o mais primitivo dos seres – palpável. Algo que a ciência não se apercebe e, portanto, não lida. É este algo que fez, um dia, um grego procurar sistematizar a arte de Esculápio, pois que temerosa tarefa havia de ter um norte.

Jurou Esculápio aos deuses, que não mais acreditamos, e como ele juraram todos desde então. Quem é que ouve tais palavras? Quem de fato as sente? Quantos, efetivamente, as vivenciam na correria que então se inicia?

As palavras, que parecem envelhecidas, encontram novos significados: quantos são os que fato entrarão “em toda casa”? E encontrarão nos irmãos escravizados pelos vícios mais atrozes o paralelo daqueles que mereceram de Hipócrates aquilo que falou de "igualdade" aos que são “livres”?

Encontraremos, nos mais afastados nosocômios, aquilo que a ciência, sempre ciosa da matéria, parece rir-se tal quando jurou a Panaceia? Onde estão “todos os deuses” a quem juraram?

Todos nós, e os médicos sobretudo, possuímos em nosso imo esses “deuses” que os Antigos falavam, cada um com o seu próprio "deus"...

No mito, Asclépio poupara de Hades uma vida e este exigiu-lhe a morte; foi a passagem onde Zeus o tornou uma verdadeira divindade. Mas, não teria já o médico o “dom divino” de antes? E, sabendo que deveria ensinar – assim jurou o primeiro médico – a todos o que sabia, conforme sabia, se não tinham todos esse mesmo “dom”?

Se fôssemos todos iguais, todos os médicos também o seriam. Mesmo entre os antepassados da família do jovem médico há o que fundou a primeira maternidade-escola do Brasil, e o que enveredou para a política, sem contudo curar... Há o que lutou pelo efêmero status e logo foi esquecido – e aquele que se transformou, mesmo que ideologicamente materialista, em verdadeiro sacerdote e professor, lutando por valores que a sociedade ainda desconhece, contra a desigualdade e a pobreza...

Não somos iguais – não em compreensão, em saber e, sobretudo, evolução. Mas somos essencialmente idênticos diante da Medicina: a dor, o sofrimento, a morte... ricos ou pobres, velhos ou jovens... também somos iguais quando olhamos para o “lado invisível” – para os “deuses” que em nós habita – e cujo destino é comum...

E na alegoria do panteão há, no plano invisível, uma vasta hierarquia, onde do mais Alto – do Olimpo mesmo – podemos sempre haurir a sabedoria: para o momento urgente em que a artéria cortada espirra o líquido vital, para o fim do dia do plantão cansativo, para o fim de semana onde o inesperado chama...

A Ciência ainda não tem todas as respostas. Pensou que as tinha, e descobriu-se enganada – e muitos ainda se fazem vítimas deste engodo... Contudo, desde que o mundo é mundo, os sábios contam-nos, com as metáforas cabíveis a cada era, onde encontrá-las.

Os “deuses” ainda existem, nos amparam, nos guiam, nos falam ao pensamento... Mesmo quando neles afirmamos não crer. Mesmo quando todos fingem seguir ignorando-os. Ou quando, não os encontrando na matéria inerte e não-animada, afirmam ser inexistentes...

Que o meu sobrinho Leone, tendo jurado como Hipócrates, tenha a luz da sabedoria a guiá-lo em todos os seus passos; que os seus pacientes recebam-lhe, sempre, o lenitivo desta luz; pois ele, sim, há de ter jurado de verdade.

Tudo de bom, Leo.

Caetité, janeiro de 2011.

Indireto no assunto – José Nêumanne e mais uma lorota



Na sua “coluna” torta, com aquele “sotaque” que procura imitar o já asqueroso e apodrecido Paulo Francis, o comentarista do Jornal do SBT – que não tenho ideia de onde saiu antes de ali aparecer falando de tudo e sobretudo, mais uma vez nos coloca diante de sua insofismável opinião plena de sofismas...

Diz lá o Nêumanne que é um "oportunismo dos políticos" armar um plebiscito pelo desarmamento, depois que um maluco atacou uma escola. Ele foi mais adiante: afirmou que as armas dos bandidos – e também a do maluco – são todas ilegais, que os cidadãos que tem lá suas armas “legais” não matam assim.

Paremos por aqui, pois a mentira do José Nêumanne Pinóquio começou e terminou ali mesmo. Com direito a pernas curtas e rabo comprido, claro.

Primeiro, o maluco da escola do Rio usou duas armas. Uma, de calibre 32, e outra, de calibre 38. Comecemos pela arma menor.

Era um revólver que fora roubado em 1994; era uma arma devidamente legalizada, cujo dono era um dos supostos cidadãos que têm o direito a se armar para a suposta autodefesa que o suposto comentarista do SBT simplesmente se esqueceu de dizer...

O malandro comentarista – sabe Deus sob quais interesses – veio a público, numa rede pública de televisão (pois que é concessão pública ter uma rede de televisão) para, mentindo deslavadamente, enganar seus ouvintes.

Mas ele poderia ter falado mais sobre a outra arma. É, aquela de calibre maior, mais letal, a que efetivamente ceifou as vidas das crianças brasileiras (pois que havia uma baiana, junto aos cariocas) e vitimou-nos a todos em nossos corações na Escola Municipal Tasso da Silveira, no bairro carioca de Realengo...

Calibre 38, José Pinóquio, lembra? A que tinha sua numeração raspada. Como bom “comentarista”, ele deve saber para que os bandidos raspam as numerações das armas... Não, ele não é bom em comentar, então certamente não sabe – ou se sabe, resolveu omitir.

Os bandidos raspam os números individuais das armas para que elas não sejam identificadas. Para que ninguém, as encontrando, saiba de onde saíram. Via de regra, foram armas compradas legalmente – até mesmo pelas polícias – e por seus donos (ou portadores responsáveis) vendidas ao crime e, forjando um roubo – da própria arma – esquivam-se de seu destino...

Esta última é a que mais dói: é a prova de que teve uma origem “honesta”, mas que desde essa origem seu destino final era apenas um: matar, matar gente inocente.

Vamos a mais um plebiscito contra as armas. Para os que não se lembram do último em 2005, a indústria armamentista – a que lucra milhões com os tiros disparados diuturnamente pelos bandidos contra as vítimas brasileiras – custeou até mesmo uma matéria de capa na revista Vendid... digo Veja... Gastaram rios de dinheiro com belas propagandas, as melhores até então já feitas, para convencer o povo brasileiro de que as armas são coisas “legais” – como disse um dia um comentarista de araque...

Mas, a realidade cruel que assistimos das mortes e mutilações, cada vez mais brutais alimentadas pelo crack e seus zumbis sem alma, é que o lucro miliardário das fábricas de armas e de munições se faz, sim, sobre as vidas perdidas de brasileiros honestos – os mesmos que estes falaciosos comentários querem fazer acreditar tenham o “direito de defesa”.

O cidadão não deveria precisar se defender. Para isto, tem-se a polícia. Ou os seguranças privados, treinados (deveriam sê-lo, claro) para nossa proteção.

Claro que esta minha fala é ofensiva ao Nêumanne: mas ele veio a público mentir, como eu disse – e mentir com algo que está custando muito, muito caro ao povo brasileiro – que ainda acredita em mentiras como as dele.

Se, ao contrário do que querem esses defensores da morte, houver um plebiscito, tenho a esperança de que o povo possa desmascarar de vez esses pinóquios e seus enganosos argumentos. E comecemos a, pela primeira vez, de fato agir concretamente em defesa da vida, de um país em que o crime seja de fato combatido, e os interesses econômicos se dobrem aos valores maiores – a vida em primeiro lugar – de uma vez por todas.

Ainda haverá crimes; as fábricas de armas ganharão menos, mas ainda faturarão muito além do que merecem; os comentaristas de araque continuarão a receber jabás de outros interesses escusos para mentir. Não haverá muita melhoria, nisto. Mas uma coisa, ao menos, é certa: haverá muito menos armas “legais roubadas”, muito menos pistolas de “numeração raspada”, e malucos terão muito, mas muito mesmo, mais dificuldades de consegui-las para entrar numa escola e matar nossas crianças.

Brasil sem armas: este não é apenas um sonho – podemos torná-lo realidade. Apesar dos Pinóquios.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Bicentenária Caetité



Bicentenária Caetité – Terra Mãe do Sudoeste da Bahia é o título do documentário iconográfico sobre os dois séculos de emancipada da cidade de Caetité.

Fruto do trabalho de pesquisa e coleção de imagens dos irmãos Adalfo e Adailton Carvalho (leia-se: Fotus K) que, com o apoio institucional da INB, foi lançado oficialmente no dia 7 de abril de 2011.

O evento simples mas solene, teve lugar no auditório da Casa Anísio Teixeira. Presentes o Prefeito e a Vice-Prefeita, o Gerente da Unidade de Caetité, dr. Hilton Mantovani que, como muitos caetiteenses de eleição – aqueles que elegeram nossa terra por morada – revelou seu amor pela cidade e a satisfação por fazer parte desse projeto, que irá ser distribuído para as entidades educacionais e culturais da cidade.

O Adalfo, inicialmente emocionado com o momento, surpreendeu-nos com um dos primeiros exemplares do DVD desse filme, ele que enveredou pela carreira de cineasta/diretor.

Esta foi mais uma das grandes ocasiões em que ficamos satisfeitos por pertencer a Caetité – e fazer parte de sua história... Tivemos ocasião de emprestar um pequeno apoio ao trabalho do Adalfo, e sei que muita informação veio ali graças a nossas pesquisas ao longo dos anos: coisas como “descobrir” que de Caetité se originaram nada menos do que 47 cidades, ou no divulgar imagens de alguns dos nossos filhos ilustres...

Uma história construída ao longo de 201 anos – pois que dia 5 de abril foi aniversário da cidade – é algo que ainda nos reserva segredos por serem descobertos – alguns deles guardados a sete chaves; outros apenas esperando para vir a lume com o devido brilho...

Mas uma surpresa me ocorreu, não exatamente ali, naquela noite. Foi um fato corriqueiro, em que eu conversava com um grande amigo de meu cunhado e resolvi sondar-lhe: você sabe quem foi Fulano de Tal? – e perguntei por seu bisavô, líder político num de nossos mais antigos distritos: “Era o padrinho de Papai” – ele respondeu; e Beltrano? “Era o avô de Mamãe, tinha a fazenda em tal lugar”. Trocamos informações, eu gratamente surpreso por encontrar alguém que não perdia suas raízes, mesmo estando tão distantes no tempo. Então, perguntei-lhe: você tem fotos dele? Não, não tinha... Fiquei de mandá-las, depois.

Na fala de Hilton Mantovani, como na daquele caetiteense “de longa estirpe” que encontrara dias antes, pude vislumbrar que podemos ter esperanças de que o passado de nossa cidade não venha a se perder no esquecimento (ou nas sombrias obras acadêmicas que, olhando os registros cartoriais, não sabem nada das pessoas que eram aqueles nomes).

Caetiteenses “de fora”, como foi minha mãe, são o “sangue novo” de que nossa terra precisa. Eles, sem dúvida, sabem “olhar” para aquilo que aqui encontram e, muitas vezes admirados, acabam sendo os responsáveis pela preservação da própria História.
Porque Caetité não é apenas a terra natal de muita gente ilustre, ou de anônimos que, daqui saindo, produziram descendentes que se destacaram... Caetité é simplesmente a terra natal de tantas cidades que, hoje, compreendem um território maior que muitos países.

De Vitória da Conquista – a primeira emancipada daqui, em 1840 – a Lagoa Real – a última, em 1989 – Caetité mantém esse papel de Terra Mãe, que o documentário Bicentenária Caetité tão bem soube retratar, de forma rápida, não enfadonha e muito bem ilustrada.

E, voltando ao lançamento do filme, fica o convite aos que não o viram, ainda, para visitarem a Casa INB, na Praça da Catedral, e assisti-lo. Vale a pena, tanto quanto vale a pena ser caetiteense. Não importa onde se tenha nascido.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Stefan Zweig e seu Fouché



Estava, numa das prazerosas tertúlias com o velho bacharel Eutropio Neves de Oliveira, lamentando jamais ter lido algo do escritor teuto-judeu Stefan Zweig, que meu amigo João Batista de Castro Jr. – hoje exilado nos pináculos da função – dizia ser o maior biógrafo que já houve, ele que é um ledor voraz de biografias.

Eutropio, claro, declarou possuir algumas obras dele e logo concertamos o empréstimo – para mim algo alvissareiro: não poderia mais deixar em silêncio quando me lembrasse do escritor austríaco que, fugindo ao nazismo, veio a se suicidar no Brasil: já terei lido o autor!

Foi assim que o volume Joseph Fouché: Retrato de um homem político (tradução de Medeiros e Albuquerque), de 1945, me veio ter às mãos. Quem seria este Fouché? Eutrópio mostra-se surpreso com minha ignorância; mas saio pela tangente, dizendo-me desinteressado por coisas de França e, mais ainda, de sua Revolução...

Uma mentira parcial: já li, por exemplo, o Otto Flake, e seu confuso relato sobre as agitações que começaram na Bastilha e terminaram com o tenente corso tomando o poder, além de tantos artigos a respeito (afinal, foi por conta deste certo Napoleão que o pessoal da Lusitânia tomou os navios e veio ter ao Brasil, atrasando a emancipação de Caetité: como esquecer deste tal Bonaparte?! He, he...)

Pois bem, fui então apresentado ao Fouché: o maior traidor da política, um homem que sobreviveu, mantendo-se sempre na crista da onda, ao período mais conturbado da história francesa.

Ovídio Teixeira, o velho senador caetiteense, dizia que em política só uma coisa é certa: a traição. Então, quem quer compreender este fenômeno politico – a perfídia – terá nesta biografia um exemplo vivo.

Olhando à volta, onde os edifícios antigos caem face o “nada de novo”, a felonia não surpreende; vem de todas as partes, até mesmo daqueles que pregam não de Judas, mas de sua vítima...

Mas uma lei inexorável, sempre, está a reservar desagradáveis surpresas aos traidores: e Fouché foi ele mesmo o exemplo disto (algo que Zweig não diz, apesar de narrar). A vida obedece, sem escapatória, à lei de ação e reação, segundo a qual pagamos o preço justo segundo aquilo que adquirimos.

Alguns, como Joseph Fouché, demoram-se na ilusão. Aqueles que, anos a fio, o assistem, podem mesmo duvidar da existência de uma Justiça Maior. E, quando esta Justiça se faz sentir, inexorável, inevitável, são poucos os que a vêem.

Terminei de ler a obra, nas páginas amareladas do papel com quase 70 anos. Stefan Zweig não viu a Justiça agindo sobre Fouché, mas poucos livros narram a Justiça agindo, como esta biografia do célebre traidor.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Alô? Nosco está?



COMO ANDA A ORTOGRAFIA EM CAETITÉ

O dia 10 de fevereiro foi para mim ocasião de constatar, com os sentimentos ambíguos de tristeza, por um lado, e de divertimento, por outro, que a língua portuguesa está a cada momento sendo mais e mais estrupicada...

Fizera eu então uma rápida visita ao Fórum Cezar Zama - que homenageia um grande escritor brasileiro nascido na Caetité "terra da cultura" - e acabei me deparando com um desses catálogos de telefones editados localmente.

Já de cara um anúncio chamou-me a atenção, ao grafar com letras em destaque, o endereço: "Avenida Wochiton Fernandes Teixeira"; e tal grafia se repetia em outros anúncios. Por curiosidade olhei como estava consignado na lista propriamente dita - e encontrei uma "Avenida Wokyton F. Teixeira"...

Seria apenas um erro por desconhecimento, já que o nome do saudoso médico Wóquiton Fernandes Teixeira era mesmo inventado. Mas ainda assim alguém que se proponha a escrever algo sobre uma cidade deveria, minimamente, consultar quem a conheça minimamente... Como respeito mesmo à memória de pessoas ilustres que já se foram...

A tal lista, porém, conseguiu ir além!

Não satisfeita em errar no nome do médico caetiteense que refundou o Hospital e Maternidade Santana, tratou de colocar o Governador-Geral do Brasil Colônia, Mem de Sá, como Mende Sá; o poeta Carlos Drummond de Andrade virou Carlos Drumont.

Pior mesmo fizeram com o Bispo da Diocese de Caetité, o Reverendíssimo Dom José Terceiro de Souza (1948 - 1957). Dom José tinha o sobrenome de Terceiro e foi, coincidentemente, o terceiro bispo da cidade. Mas a lista, claro, inovou! Ali, temos a rua D. José Iii!!! Seria, então, um rei de Portugal? Sim, porque jamais seria nosso antigo prelado - afinal Terceiro era seu nome, não um título; mesmo sendo o terceiro bispo, foi o primeiro a se chamar José...

Pior foi acessar um site em que havia o link para o contato; no cabeçalho estava correto: Fale conosco. Mas, abaixo da janelinha para contato, havia uma mensagem que reproduzimos acima: "Se preferir pode entrar em contato com nosco"...

Parece que vivemos numa cidade de escritores que não mais sabem escrever... Mas a realidade é outra: o descuido com a língua, com a história, é reflexo não do imediatismo - mas da preguiça mental, da falsa economia que faz com que os registros que passem ao futuro guardem do presente uma triste realidade de ignorância e de fajutas publicações...

Contratem revisores; coloquem seus nomes para que todos saibam quem está a fazer essas - com o perdão da palavra - cagadas...

Que se nosso rico comércio paga por tais anúncios, que ao menos seus filhos e netos, lá adiante, não sintam vergonha de verem como no século XXI eram burros seus anúncios...

E, para finalizar, faço um convite aos leitores para acessarem a Wikipédia, para lerem o verbete sobre o pioneiro do presbiterianismo no Brasil, o Reverendo Henry John McCall. Ali, graças a mim e ao belo trabalho de um pesquisador protestante, vemos não somente a grafia correta do nome deste inglês que em Caetité fundou a Escola Americana, mas sua biografia - que merece ser lida e admirada. Porque quem quer que suba a Avenida Santana e encontre a primeira travessa a ligar esta importante artéria com a Rua Barão de Caetité, encontrará uma placa a grafar "travessa Rev. MACAL"*...

Triste Caetité... terra da cultura apagada...

*Justiça seja feita: ao tempo que demorei para publicar esta postagem a placa com o nome da rua do reverendo Mc Call foi consertada - e seu nome devidamente consignado de modo correto.

sábado, 22 de janeiro de 2011

Anísio para Caetité



Disse lá o José Pacheco - educador português que no começo de 2010 visitou Caetité - após constatar que os educadores na própria cidade natal nada tinham a informar sobre o Anísio Teixeira:
Em Caetité, encontrei uma secretaria de educação feita de boa gente e com muita vontade de melhorar. Mas não resisti a perguntar: O que há de Anísio nas escolas de Caetité? Qual o legado de Anísio, que se faça presente nas práticas escolares? Respondeu-me um embaraçado silêncio.

O "mal" não é menor. Infelizmente. Mesmo com o trabalho da Casa Anísio, mesmo tendo lá o Instituto de Educação, ainda assim não raramente escutamos coisas como "o que fez Anísio Teixeira para Caetité?"

Fez - e indiretamente ainda faz - e muito!

Anísio deixou-nos um legado que não para de crescer, e dar frutos.

Para tentar suprir um pouco desta lacuna, empreendemos uma pesquisa, a reunir numa só obra o que viveu e fez por Caetité o seu filho mais ilustre.

Servindo como referência e início na (re)descoberta do Anísio, a ideia é não tornar o nome mais famoso - e sim a pessoa menos desconhecida!
Apesar das nossas limitações, é um projeto ainda no seu início - precisa agora de apoio. Mas precisa, sobretudo, ser efetivado - para que ninguém que nos faça uma visita possa novamente escrever que, em Caetité, Anísio Teixeira sofre uma "segunda morte"...

Fica, aqui, mais um convite para os que se interessarem conhecer este nosso novo livrinho, em seu nascedouro: Anísio para Caetité - o livro