terça-feira, 27 de outubro de 2009

Ui-que-pedia


Ou: Como ter um verbete jogado no lixo

Passei um bom tempo de minha vida editando na versão em português da Wikipedia. Cheguei, a contragosto, a ser "administrador" lá e, também a contragosto, deixei de sê-lo.

Muita gente "mora" na Wikipédia lusófona; alguns têm lá suas brigas, seus desentendimentos, que se arrastam por meses, anos até, sem que haja qualquer solução; porque na qualidade de internautas, gozam da memória extra do computador para não esquecerem jamais (e, consequentemente, nunca perdoarem); há, também, no caso da Wikipédia, uma memória extra - já que todas as edições feitas ficam indeléveis nos históricos de cada página: esse o combustível. Os usuários que não perdoam, são o comburente...

Meu "compromisso" em editar ali era o chamado "domínio principal" - os verbetes propriamente ditos, seu conteúdo. Milhares de edições, consertos, uma luta por levar informações nem sempre fáceis de obter. Uma chance única, por exemplo, de poder falar de figuras que dizem respeito à história da minha cidade, do Estado da Bahia e, enfim, do mundo todo.

Partindo da aldeia pequenina, para a aldeia global.

Tive, até, a felicidade de, no passado, comprovar na prática a importância desse trabalho, quando via alunos do nível secundário e até da universidade, tomando por base coisas que eu havia escrito ou ajudado a escrever, um dia...

Mas, como já falei, as disputas surgidas nunca são abandonadas. Não quero dizer que não as tenha provocado, com o jeito ríspido de "falar" - mas nunca entendi o motivo de alguns usuários simplesmente se antipatizarem perpetuamente...

Saí do projeto, depois de mudar meu "nome" - tinha usado o nome verdadeiro e acabei sendo xingado por irresponsáveis anônimos (claro, escondidos por "nomes" criados para o registro ali).

Como recentemente disseram, volto como "turista". Mas mesmo como turista é difícil continuar... E, infelizmente, como eu dezenas de outros usuários mais assíduos foram embora, quer permanentemente, quer com voltas esporádicas.

Fiz grande amizades na Wikipédia. Um cearense, morador de Londres, por exemplo, chamado "MHV"... Depois, ele saiu do projeto e, numa das voltas últimas, veio para brigar comigo... É estranho isso, pois até agora não vejo o que fiz a ele pra que isso se desse assim. Mas tenho ainda enorme carinho por ele, e todos com quem pude travar esse estranho relacionamento amistoso que a internet nos proporciona...

Há uma página na qual podemos observar o que vem ocorrendo; chamada de "mudanças recentes", retrata tudo o que ultimamente vem se passando. Ali vi, há pouco, que um anônimo havia escrito algo indevido num verbete intitulado "Justiça Especial". Ao ler o conteúdo, porém, vi que o conceito dado era totalmente diverso daquele que o Direito brasileiro determina; apaguei e reescrevi. Mas sei que, daqui a algum tempo, o verbete estará todo "manchado" - cheio de marcações e vandalismos não revertidos.

Porque, com a diminuição dos que efetivamente colaboravam contra os vândalos de conteúdo, as reversões de erros acabam ocultando erros mais antigos, até termos coisas como o Farsa de Inês Pereira, que registra:
Entretanto entram em peça dois “cimenteieros judeus” que também cuidavam de arranjar cimento para +3, e se bem procuraram melhor acharam e Inês se casa com um escudo, de sua graça Bras da Mata

Trazendo frases que um dia foram:
Inês Pereira, moça simples e casadoira mas com grande ambição procura marido que seja astuto, sedutor, “que saiba tanger viola, e eu coma cebola.”

mas que, quando escrevo, estão:
Inês, moça simples e casadoura mas com grande ambição procura marido paniscao que seja astuto, sedutor, “que saiba tanger viola, e eu coma coco.”

Comer coco ou cebola não têm tanta diferença - especialmente para a qualidade dos que preferem brigar entre si do que ver o que se vai no domínio principal (verbetes).

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Hoje não vejo mais, como antes, as pessoas a consultar a Wikipédia... A começar por minha filha, que ali se servia e agora, simplesmente, torce o nariz quando lhe falo desse projeto...

É que as pessoas não ficam comendo coco, quando compram cebolas. Acho...

Ao propor como destaque o verbete Agricultura no Brasil, acabei ouvindo coisas como "nenhum agrônomo, por exemplo, leria esse artigo e votaria a favor". Nem respondi mais, talvez em consideração ao meu cunhado, ex-diretor da EBDA, e que me deu oportunidade de ilustrar o verbete com várias de suas plantações, autoridade que é em fruticultura, algodão e tantas cositas más...

A verdade na wiki é assim: um sujeito qualquer vai lá, diz que um agrônomo não iria gostar de algo - e o que ele falou é incontestável. Pensei até em convidar o cunhado pra rir comigo do tal comentário, mas ele é muito ocupado pra isso...

Fica-me o consolo, entretanto, de saber que a Wikipédia poderia ter sido uma experiência única de democratizar o conhecimento; foi o que fiz e não me arrependo.

Mas fica, também, a constatação de que num espaço de birras e mediocridades, o resultado final é que estaremos comendo coco no lugar de cebola...

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

História carangueja...



O livro "História da Bahia", do eminente Luís Henrique Dias Tavares, é uma obra interessante.

Poucos conhecem a História desse Estado, sua riqueza e personagens marcantes.

Mas... Algo nos chama a atenção ao longo dessa obra - como de resto em quase todos os livros de História sobre o Brasil: é como se as coisas apenas ocorressem num só lugar: a capital, o litoral...

Lembro-me, no caso do livro do Dias Tavares, de haver procurado um tema específico, pensando algo como: "não tem como este sujeito falar disto sem se reportar ao sertão!".

O tema era o chamado "Mata-Maroto", lutas que duraram mais alguns anos após a Independência brasileira e baiana (para os que não sabem, aqui na Bahia houve lutas, que começaram antes mesmo do tal "Grito do Ipiranga", e só se terminaram quase um ano após ele, a 2 de julho de 1823) - e que ganharam grande relevo nas Vilas de Caetité e Rio de Contas...

Que decepção: o professor Dias Tavares, que parece haver esquecido o parentesco com o gigantesco e genial caetiteense Nestor Duarte Guimarães, enxergou o "Mata-Maroto" como algo do litoral!

Nem, ao menos, se lembrou do também genial Anísio Teixeira - contra quem, aliás, na juventude, Dias Tavares andara a escrever panfletos inflamados - nascido na mesma Caetité que, ao que parece, não existia na História tavariana...

Qual caranguejo, a História fica restrita aos grandes centros e ao litoral brasileiro. A "periferia", coitada - ainda padece de, sei lá, preconceito?

Oh, Minas Gerais!
Criador do "Projeto Manuelzão", o médico carioca e professor da Federal de Belo Horizonte, dr. Apolo Heringer Lisboa, publicou certa feita um livro, escrito por seu pai - Abdênago Lisboa - intitulado "Octacilíada - uma epopéia do Norte de Minas".

Quando tive a obra em mãos, olhei-a com aqueles olhos de quem procura algum elo com a minha aldeia. Sem muita esperança, é claro: afinal, era sobre Minas Gerais. E, se nem um historiador baiano falava de Caetité, muito menos aquela... EPA!

Foi como se um gelo me percorresse a espinha! Em meio a páginas de fotografias, deparei-me com uma - muito, muito antiga - de um tal João Caetano. Não era nada, não: era ninguém menos que o sujeito que, duzentos anos atrás, construíra a casa em que moro! E de quem eu nunca soubera houvesse uma fotografia!

E foi então que passei a descobrir, em muitas obras da História mineira, que Caetité estava lá! Porque, mesmo os caranguejos tavarianos fingindo não saber, o Sertão produziu muita coisa, influiu (e influi) em muitas outras.

Eu, que achava que a ligação com Minas e Caetité vinha do Neves do Tancredo (sim, saiu daqui), ou dos povoadores cultos da cidade, mineiros fugindo na época da Inconfidência, ou mesmo com o prosaico estudo na cidade do esperto (mas não culto) Newton Cardoso, passei a colecionar pérolas, como "Raízes de Minas" do Ribeiro Pires - a falar dessa minha aldeia - ainda ignorada pelos caranguejinhos...

Dividamos a Bahia, ora pois!

A idéia, fracassada quando da Constituinte em 1988 - graças a uma bela campanha feita em Salvador - a terra dos caranguejos - com o singelo slogan "Alto lá! A Bahia ninguém divide" - seria uma das soluções para termos um governo que não ficasse, assim como os caranguejos, voltado somente para a Capital...

A Bahia, gigantesco como Estado, é algo miúdo por conta de seus políticos. Enquanto Minas Gerais tem lá suas 20 Universidades Federais, a Bahia tinha apenas uma. Quando o Lula criou (dizem) a Universidade do São Francisco, o rio que tem sua maior extensão nesse mesmo esquecido sertão, olha só onde foi ficar a sede: em PERNAMBUCO! Que já tinha, sei lá, três ou quatro Federais! O Pernambuco de Lula é uma tripinha, comparado à abandonada Bahia!

Para "compensar" tal desfeita, lá veio o bondoso Lula criar outra Federal na Bahia. Sabem o que ele fez? Criou a Federal onde a UFBA tinha o Campus de Agronomia, e batizou-a com o nome do Recôncavo...

O povo lê Bahia e entende que o estadinho limita-se à baía... de todos os santos e caranguejos!

Por isso, tenho como herói alguém que Salvador matou como bandido: Horácio de Matos. Horácio, nos idos dos anos 20 do século passado, criou o "Governo de Lençóis" e, dali, da cidade incrustada na bela Chapada Diamantina, mandava no Sertão.

Já antes o caetiteense Rodrigues Lima cogitou mudar a Capital para Vitória da Conquista. Chamaram-no, os caranguejos do século XIX, de louco; mas era mesmo por saber que os caranguejinhos morrem de medo de olhar a terra!

Tem esperança?
Ufa! Escrevi demais! Mas tava pensando nessa moça, a Dilma Roussef. A que quer ser nossa primeira Presidenta. Ela é mineira...

Mais: há uma semana (dia 7 de outubro de 2009), no aniversário do "quase" caetiteense e primo distante Haroldo Lima, Dilma em discurso fez uma revelação: declarou-se bisneta de um caetiteano.

Tudo bem que não falou caetiteense... Mas ela tem raízes aqui! Vai que ganhe a eleição? Ao menos, quem sabe, não olhe o sertão com os olhos de peixe morto de um Wagner, ou mesmo dum Magalhães...

Porque Lula, esse que assistiu sua "virada" ocorrer na "caetiteense" Vitória da Conquista, fez nada não.

E, já que não vamos nos emancipar dessa Baía (sem h, que não merece), não nos custa sonhar...