sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Coelho na cartola



Parece que virou lugar-comum, ao menos nas revistas que tratam de literatura ou mesmo na internet - menosprezar o trabalho do Paulo Coelho.

Nunca entendi direito a motivação para tal. Lembro-me duma charge em que o rato de sebo mandava um burro ler livros de auto-ajuda, Paulo Coelho e, se um dia lesse Machado de Assis... que voltasse dali a 20 anos...

Paulo Coelho faz sucesso, é membro da Academia Brasileira e, não bastasse o sucesso internacional de ser lido em diversos países, sua obra é considerada "menor"...

O que faltou ao Coelho para merecer cidadania literária? Criatividade? História? Falar de temas cotidianos de modo barroco? Ter nascido no século XIX, talvez...

Ou, quiçá, haver nascido no Brasil da virada do Milênio o torne menor do que realmente é?


Tudo isto porque, há pouco tempo, a França celebrou o sumiço do escritor Antoine de Saint-Exupéry, desaparecido misteriosamente durante a II Guerra Mundial. Autor do livro infanto-confuso "O Pequeno Príncipe" (Le petit prince). Obra-prima lida por todas as misses nos concursos de tempos passados, para aqueles que não se lembram ou não eram nascidos... Pois a França celebrou sua memória, nos 65 anos sem o autor do livreto das misses.

Como se fora um heroi nacional francês, o autor de O Pequeno Príncipe foi (e é) cultuado.

Cá eu comigo penso... Que diabos de literatura é O Pequeno Príncipe para que figure num patamar acima de... Diário de um Mago, por exemplo?

Entre um e outro, a qualidade do autor brasileiro é mil vezes superior; a seu favor conta, ainda, o fato de que foi lido por um presidente dos EUA - o equivalente moderno das antigas misses? Pois que não me consta seja o Paulo Coelho a leitura de misses...

Acho, mesmo com base em algo que escrevera Anísio Teixeira muito tempo atrás, que inda estamos divididos - os intelectuais - entre aqueles que fingem saber e os que falam mal dos que sabem...

Infelizmente para nossa memória, e para o Paulo Coelho, os da segunda espécie são os modernos Paulo Francis - fracassados a deitar o cacete naqueles que conseguiram...

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Filhote da ditadura: a impunidade



A imagem ao lado faz parte dum email tipo spam que recebi, e que trata a Ministra Dilma Roussef como terrorista, que efetivamente foi.

Mas a questão de fundo é pior, mais suja e nojenta: trata de defender a impunidade de criminosos que, em nome do Estado que tomaram covardemente à força, querem justificar seus crimes dizendo que "o outro lado também os cometeu".

Isto, hoje, faz com que fechemos os olhos à pena de morte aplicada por policiais militares despreparados, e que muitas vezes atende a encomendas de quadrilhas, sistemas primitivos de vingança e outras - como uma que ocorreu no final de 2009 na Região Metropolitana de Salvador - uma terra sem lei - para ficarmos num pequeno e trágico exemplo que se alastra do Oiapoque ao Chuí.

A Ditadura Militar brasileira foi o que de mais abjeto poderia ter ocorrido em nossa história. Começou pelo crime de lesa-Constituição, que foi a de derrubar um estado de direito. Nada, portanto, feito sob a égide disto, pode ser justificável: o militar jura cumprir a Carta Maior do seu país. Qualquer militar - de ontem ou de hoje - que justifique esse golpe canalha, fere antes a si próprio, em sua honra de servir ao seu povo.

A ditadura, e não a democracia que derrubou acusando de corrupção, foi quem introduziu no Brasil a impunidade. Tanto na política, como fora dela. Foi das fileiras de nosso Exército que saiu o Capitão Guimarães, bicheiro e chefe de quadrilha do conflagrado Rio de Janeiro: o Exército, bem antes das chamadas "ações pacificadoras", já ocupara os morros... Da pior e mais cruel forma possível.

Ao deixar os quartéis, não para defender o povo brasileiro, mas para arvorar-se em tutor do mesmo, nossos militares se associaram à pior espécie de bandidos: aquela que se arma das próprias instituições para a prática dos delitos.

Falam do avanço econômico - mas todo ele foi feito num "milagre" que ergueu grandes empreiteiras que, para além de obras faraônicas, se especializaram numa coisa só: superfaturar e dividir a bolada, em expressões que - de tão comuns - são usadas até pelo presidente como desculpa - como a tal "caixa dois"...

A coisa foi tão gritante que hoje não há uma só estrutura do Estado que seja confiável. Os três poderes (em minúsculo) em todas as suas esferas, se corrompem. E, por estarem tão corrompidas, o dinheiro faz criar uma aura de impunidade que se efetiva proporcionalmente ao poder aquisitivo do infrator.

Autora de coisas como a Lei Fleury - algo tão abjeto que leva o nome de seu beneficiário - a Ditadura volta a chorar por impunidade... Por que o medo de nossa justiça? Afinal, o sistema que legou-nos de herança não é justamente aquele que nunca pune os que podem pagar?

Me perdoem os bons militares que souberam reconduzir o país à normalidade, e mesmo hoje lutam para mantê-la, honrando seu juramento à Pátria e à Constituição; mas a "defesa" que tentam agora fazer é mesmo um acinte à História, á Decência!

Por que não usam dos recursos usados para atacar uma Ministra - que será julgada, espero, pelas urnas - para protestar contra a impunidade, o mal que continua matando milhares de brasileiros a cada ano?

Ou, então, teremos que voltar a ouvir a frase que vocês, que cuspiram na Ordem em 1964, tanto repetiam: "Você sabe com quem está falando?"...